Mais tarde, Dominique soube que tinha um câncer que não podia ser operado e pediu licença para se transferir de Saint Remy para Paris, onde viveria perto da família e de parentes. Numa atitude perfeitamente compreensível para aqueles de nós que o conhecíamos, Dominique arrumou um emprego de vigia noturno em uma fábrica próxima. Ele fazia o chamado turno do cemitério: das 11 da noite às 7 da manhã. Dizem que todos os dias, quando saía do trabalho, visitava um parque que ficava do outro lado da rua onde morava, um lugar cheio do que a sociedade costuma chamar de "ralé" - bêbados, jovens e velhos, sem-teto, derrotados.
Meu bom amigo trocara o velho hábito por um novo: agora ele levava conforto aos mais desprezados, ouvia suas histórias e sempre deixava com eles uma notícia boa, palavras que eu ouviria centenas de vezes: "Jesus Cristo é louco por vocês. Ele os ama do jeito que vocês são, não como deveriam ser".
Um dia, de manhã, o turno do cemitério decidiu não liberar Dominique. Amigos descobriram seu corpo sem vida caído no chão do apartamento onde morava. A causa da morte foi um ataque cardíaco. Creio, porém, que Dominique morreu de uma causa oposta: entrega do coração. Era um homem que havia se rendido, que tinha doado partes do coração a outras pessoas durante toda a vida: uma palavra boa aqui, um toque gentil ali, um encorajamento sempre. Encontraram o diário de Dominique onde ele havia feito uma última anotação:
-Tudo o que não for o amor de Deus não tem sentido para mim. Posso dizer verdadeiramente que não tenho interesse em coisa alguma, a não ser no amor de Deus que está em Cristo Jesus. Se Deus quiser, minha vida será útil por meio da minha palavra e do meu testemunho. Se ele quiser, minha vida dará frutos pelas minhas orações e sacrifícios. Contudo, a utilidade da minha vida é do interesse dele, e não meu. Seria indecoroso eu me preocupar com isso.
Muitas vezes ao longo dos anos me perguntei por que tive o privilégio de ser amigo de Dominique Voillaume, de ter minha vida tocada por esse herói desconhecido, de ser um dos milhares presentes ao seu velório a parar por alguns momentos entre as velas e olhar para seu rosto. Não sei bem por quê. [...]
Para algumas pessoas, talvez, a expressão "Deus o ama como você é, e não como deveria ser" seja um sinônimo de Brennan Manning. Eu diria que é isso mesmo, mas acrescentaria que essas pessoas deveriam saber que a verdade por trás dessas palavras foi impressa em mim pela vida de um homem que a experimentou em si mesmo.
Brennan Manning - Deus o ama como você é e não como deveria ser, por que você nunca será como deveria ser.
segunda-feira, 5 de novembro de 2012
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